Diversidade
A importância de compreender a interseccionalidade no ambiente de trabalho. (por Yara Magabeira)

Luis Otávio 18/11/2021 1464

Mais um mês da consciência negra que chega e, mais uma vez, lembramos da importância de compreender um fenômeno psicossocial conhecido como ✨Interseccionalidade ✨. Para tanto, tentarei expor algumas experiências que vivo e vivi sendo uma pessoa trans e preta inserida no ambiente laboral de algumas empresas da Zona Sul da cidade carioca. 

Lembro bem quando comecei a pensar em transição de gênero. Queria alcançar aquele simulacro estético e estereotipado do feminino ocidental. Queria todos os mais complexos procedimentos mas, para isso, precisaria de muito dinheiro. Logo, agora já retificada como Yara, decidi me aventurar no mundo das startups, julgando ser um ambiente um pouco mais tolerante e preparado para dialogar com as pautas que meu corpo carregava. 

Logo no primeiro dia, meu contratante fez questão de avisar a todos que eu era uma pessoa trans, portanto, deveria ser referida com pronomes femininos. Lembro-me de ter achado uma atitude fofa, ainda que não tenha pedido. Todos da equipe acharam o “máximo” e me deram as boas-vindas. 

Ainda no primeiro dia, me deparei com uma insegurança comum às pessoas trans: “ Qual banheiro devo usar? O feminino, claro! Mas e se isso causar um frisson? Não quero causar turbulência no meu primeiro dia. Vou usar o masculino! Mas aí eu estaria negando toda a identidade que luto diariamente para conquistar. Vou no feminino… Quer saber, eu nem estou tão apertada assim. Fiquei apertada até a hora de ir embora.”

Já no segundo dia, decidi pedir ajuda para o meu contratante. 

- Sabe Yara, aqui somos uma empresa diversa e você pode usar o banheiro que preferir. 

- Ah, legal! Mas por que não temos banheiros neutros? E mais, por que não temos banheiros para pessoas com necessidades diversas? Inclusive, e as rampas de acesso, onde estão? Se somos uma empresa diversa, deveríamos nos preocupar com isso, não?! - Fiquei sem resposta. 

Algumas semanas depois, agora já usando o banheiro que me convinha, recebo o seguinte convite: “Adoraríamos que você fizesse parte do nosso comitê de diversidade! Achamos que tem tudo a ver com você!Eu topei.

A TROCA pode te ajudar a implementar uma política de inclusão na sua empresa.

Ingênua, acreditei que essa equipe seria composta por outros membros da equipe, e não só eu. Achei também que esse serviço seria a parte do meu salário. Bom, parece que eu achei coisas demais. Quando vi, era responsável por diferentes setores, respondia por diversas minorias, me apresentavam como a embaixadora da diversidade da marca e continuava com o mesmo salário de estágio. Aguentei até onde deu e pedi as contas. 

Gosto de usar esta situação como exemplo para falar de um mau entendimento de interseccionalidades pois, de forma mesquinha, supuseram que eu, por estar no corpo que estou, seria capaz de dialogar com as pautas de outras minorias, ainda que eu não tivesse nenhuma capacidade de fazê-lo. Entenderam também que uma pessoa só seria suficiente para administrar toda uma área de uma empresa, justamente por essa pessoa se encaixar em dois ou três grupos minoritários. E ainda queriam que tudo fosse feito de graça. 

Entender interseccionalidades, para mim, é mais simples do que parece, basta:

  1. Tratar uma pessoa como uma pessoa 

2. Aprender de onde essa pessoa veio e para onde vai; 

3. Conhecer e ouvir os limites sócio-históricos que a pessoa carrega consigo, e aprender com eles; 

4. E, principalmente, abandonar a ideia de que um símbolo de sobreposições de recortes sociais é suficiente para dar conta da diversidade de uma empresa, porque não é. 

5. Para abraçar a demanda interseccional que emerge no mercado, a empresa - ou a startup - precisa trabalhar sempre com grupos.

Desse modo, independentemente se pessoa física ou jurídica, percebemos a urgência de trabalhar a empatia no ambiente laboral, pois num país com uma história como a do Brasil, a diversidade interpessoal é certa, e o mercado clama por isso. Não só por modelos negros(as) e trans em propagandas nos meses especiais, mas também por CEOs mulheres negras, gerentes indígenas, vereadores(as) e deputados(as) LGBTI+. Clamamos por um país tão colorido quanto somos.

Yara Mangabeira - Estudante de psicologia e produtora cultural.


Luis Otávio

Luis é natural do Rio de Janeiro, tem 30 anos e atua na cena carioca das festas com sua personagem Onírica. Artista, web designer e produtor cultural, nas horas vagas ta sempre no mato buscando paz e encontrou na yoga um ponto de encontro com o equilíbrio e o bem estar.

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