Desigualdades
A falta de diversidade no mundo acadêmico. (por Lucas Batista)

Luis Otávio 30/11/2021 672

A universidade acostumou os meus olhos a enxergarem a ausência de pares meus no mercado de trabalho como algo natural.

A duras custas e lutas dos movimentos sociais brasileiros frente a uma ampla resistência de grupos dentro e fora da academia, em 2012 foi sancionada a lei de cotas. A lei propunha uma equiparação de oportunidades, a presença de negros e negras estaria, enfim, garantida nas universidades.

Apesar da lei ter sido sancionada em 2012, só em 2014 a política foi adotada pela universidade que estudei. E foi neste mesmo vestibular que ocupei meu lugar na academia. Costumo dizer que sou um dos caçulas da política de cotas.

Ainda que tardia, é incontestável a importância da política. Contudo para além de garantir o ingresso da população negra na universidade, é necessário o aprimoramento da política para permitir a permanência de negros e negras, não só financeiramente, mas também emocional e psicologicamente.

Não me dediquei durante meus anos na universidade ao estudo das questões raciais e fora da universidade também não sou estudioso do assunto, mas me permito fazer esse relato e tecer opiniões e comentários a partir das minhas leituras e da minha vivência.

Eu ousei me tornar cientista. Eu até considero que o cientista é alguém dado a ousadia, mas não pelas mesmas razões que EU ousei. Me considero ousado pois decidi ocupar e permanecer em uma posição que é socialmente tida como branca.

O cientista na imaginação tem uma cara, e me dói dizer que fora do imaginário a cara continua a mesma. Homem, branco, grisalho, ou quase, de meia idade. De 2014 a 2018 estive integralmente imerso no projeto de me tornar um geólogo. Em nenhuma ocasião, nenhuma mesmo, eu estive sentado à frente de um professor negro.

Essa afirmação pode até parecer uma denúncia, mas não tem a intenção de ser. O conjunto de professores sabe dessa situação. Certa vez até ouvi de um professor importante, desses que são estrelinhas de departamento, que a ausência de professores negros não era um problema. Ele completou: “tínhamos um, mas ele faleceu”.

Provavelmente, para esse professor e seus pares a ausência de professores e professoras negros e negras continua não sendo um problema. Tenho inúmeras razões para considerar a ausência de pessoas negras na docência um problema, mas me reservo neste texto a falar sobre o problema dessa ausência na formação e na permanência de jovens negros e negras na universidade e seus desdobramentos na vida profissional.

A TROCA pode te ajudar a implementar um Programa de Inclusão para pessoas pretas.

Trago a minha história para a ciência que faço”. Essa frase eu retirei do relato da colega geóloga Adriana Alves para a Folha. Em cima dela eu faço as considerações a seguir:

É fundamental, para além das vagas, que o ambiente universitário acolha a história dos estudantes negros e negras. E que haja correspondência em todos os seus quadros em proporção com a realidade da sociedade brasileira.

Essa correspondência é necessária não por supor uma simples identificação pela cor da pele, que dada a realidade é também importante, mas para que as várias histórias negras encontrem, no lugar do eco, outras semelhantes.

Os parágrafos anteriores demonstram um anseio para o presente e futuro, e não encontram semelhança com a realidade que vivi. Precisei alienar minha cor, e parte da minha história, para alcançar o geólogo em mim. Não estendo esse sentimento aos meus poucos pares negros e negras da faculdade exatamente por considerar que nossas histórias são múltiplas, mas não me surpreenderia se eles tivessem essa mesma percepção.

Não posso dizer que não me surpreendi ao encontrar pessoas negras na equipe da empresa que trabalho, ainda que contáveis nos dedos das mãos, era uma proporção ligeiramente maior à da faculdade, sendo que alguns ocupam cargos de coordenação. Esse último fato, o de ter negros(as) em cargos de tomada de decisão, me possibilitou sonhar.

A situação que me permitiu sonhar ainda não foi aquela que eu acredito ser essencial ao acolhimento de pessoas negras, seja nas universidades ou no mercado de trabalho. Eu me permiti sonhar ao ver a minha cor em um espaço diferente daquele que a sociedade me reservou. “Dar cor aos personagens”, como disse Mano Brown, continua indispensável, mas ter sua história compreendida e recebida pela vivência em comum é algo com significado e importância ainda maior.

Almejo que histórias negras se encontrem, e permitam que outras histórias e caminhos sejam traçados. Não tenho dúvidas que a partir desses encontros ideias inovadoras surjam, problemas antigos sejam, enfim, solucionados e que outras possibilidades de mundo emerjam.

Para isso, a presença de pessoas negras em todos os espaços e equipes precisa não ser apenas encorajada, mas efetivada. Para saber como fazer isso da forma correta aconselho a leitura de outros textos deste mesmo blog, destacando os dois últimos:

E nunca se esqueça que a diversidade e a prosperidade caminham juntas.

Lucas Batista é Geólogo formado pela UFRJ, Pós graduando em meio ambiente pela Coppe e trabalha com E&P na indústria de Óleo e Gás. :)


Luis Otávio

Luis é natural do Rio de Janeiro, tem 30 anos e atua na cena carioca das festas com sua personagem Onírica. Artista, web designer e produtor cultural, nas horas vagas ta sempre no mato buscando paz e encontrou na yoga um ponto de encontro com o equilíbrio e o bem estar.

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